Inspire! Respire! Observe! Vivencie!
ECOS: A natureza que nos cabe é o encontro de três artistas: Alberto Duvivier Tembo, Chris Coutinho e Maristela SR. Essa exposição dá a ver as diferentes percepções ambientais de cada um por meio do sensível. Todos atentos às vivências multiespécies, nos relembram o que escreve Anna Tsing: “Precisamos entender as afinidades humanas e não humanas que possibilitam arranjos antropocêntricos, bem como as trajetórias históricas mais-que-humanas que se juntam em terríveis hegemonias e manchas de esperança ou resistência”.
O que nos resta? Alberto Duvivier Tembo traz o elemento fogo para o seu processo de criação. Com um maçarico, chama a nossa atenção para a extinção: seu gesto de pintar é o da imprecisão, da incerteza, do incontrolável. Paisagem já inicia a exposição com um alerta: várias camadas-floresta gritam por atenção. Mangue representa um jacaré, um periquito e um peixe-boi. Na elaboração dessas pinturas, esses animais são fragmentados e reorganizados em uma espécie de emaranhado na montagem desta mostra. Nesse processo, o artista chama nossa atenção para interdependência dos seres diante das problemáticas do antropoceno. A série Catálogo de seres extintos representa outros animais numa perspectiva mais abstrata, monumentaliza-os, ao identificar seus nomes científicos. Por fim, O Elefante reconta um poema de Carlos Drummond de Andrade em que esse animal diariamente e incansavelmente é construído e reconstruído, fazendo “[…] alusões / A um mundo mais poético / Onde o amor reagrupa as formas naturais […]”. Por esse viés, como somar rastros do que deveria e poderia ser preservado da biodiversidade?
Como redesenhar a paisagem?
Chris Coutinho possui um trabalho complexo e minucioso em que os nomes das técnicas e linguagens da arte não dão conta. Entre o desenho, o recorte, a composição, a colagem, emergem gestos que chamam a atenção pelo rigor, mas também pela delicadeza.
Atualmente, a artista vive em Vitória (ES), onde existe, segundo a prefeitura da cidade, a maior área urbana de manguezal no Brasil. Este bioma é representado na obra Mangue como um ponto de partida de “esperança” e “resistência”, continuando a reflexão proposta por Tsing ao buscar brechas de natureza no ambiente urbano. Já o trabalho Respiro multiplica diferentes desenhos de observação numa tentativa de rebater os olhares anestesiados, causados pela velocidade acelerada de nossos dias.
Os fragmentos são produzidos em diferentes momentos e lugares, em que a artista leva o desenho para passear.
Nessas danças de camadas intercaladas, ambos os trabalhos nos questionam: como cada um percebe o seu entorno?
Como ressignificar as coleções da flora e outras espécies não humanas? Maristela SR nos convoca a olhar de outro modo para os ciclos naturais.
Seu processo inicia com coletas de flores, folhas, sementes e conchas que esbarra pelo chão. A artista considera esses elementos como garantia de que a vida continuará a ser nutrida, armazenando-os e conservando-os de diferentes formas. Posteriormente, estas espécies são reunidas nas séries de fotografias (A pele volátil do planeta ainda respira e agarrar-se aos fluxos naturais) e nos desenhos (que compõem as séries de pequenos formatos Evocar memórias…, Semear oceanos, Atiçar marés, Folhai-vos!, Lascivas). Outras coleções são constituídas nos trabalhos Para sonhar com um jardim-devir…, Um acervo para o antropoceno… e Cadernos são sussurros. Nessas tecituras da memória, apresenta- nos o encantamento da duração do tempo, propondo por uma perspectiva rizomática diversas possibilidades de reencontro entre e com as espécies que são a base do seu trabalho. Como ativar nossa percepção botânica e torná-la afeto?
Aqui encontramos coleções, coleções da flora e da fauna. Os três artistas propõem outras perspectivas de perceber a natureza e, por meio da arte, a catalogam.
Ecos é a simbiose dos processos de criação dos três.
Considere a importância dos manguezais para a retenção de carbono, para a preservação de ecossistemas e como fonte de subsistência para as pessoas ao redor desses locais. Relembre que um dos
significados de “ecos” é “casa” e que ecologia consiste na ciência que estuda os seres vivos no local onde vivem, em suas “casas”. Esta exposição manifesta, então, urgências, convidando a olhar para o que nos rodeia e a discutir a habitabilidade do planeta.
Ananda Carvalho