André Bonani
São Paulo, 1988
André Bonani, ao perscrutar os caminhos de sua criação artística, teve o dom de nos transportar a um lugar distante, mas que faz parte de nosso imaginário:-
(…) Estamos no interior da Serra da Capivara, diante de suas paredes cheias de inscrições rupestres. Ao olhá-las, atentos, percebemos que essas cifras acolhem, na sua constituição, o “empolamento do calcário e servindo-se dessa massa” deflagram um outro signo que nos dá a dimensão da profundidade onde estão situadas.
A imagem levou o artista a pensar em grafismos que, ao se justaporem à matéria, originam certas correlações de coisas que habitam um mundo de fronteiras. E essa contingência, gerou em André um adágio criador:- “elementos gráficos interferidos pelo espaço que os circundam, a ponto de expressarem um signo carregado de formas artísticas significativas, movem-nos a uma dimensão amalgamada em horizontes incompatíveis. Como nos aproximar desse fenômeno percebido?” De início, ao buscar essa aproximação, o artista pesquisa o grafismo justaposto à matéria, em suas incursões pela gravura em metal. Mas logo dela se desprende para tratá-la como um processo escultórico, já que percebe sua matriz toda marcada por códigos que se liberam e se projetam no espaço do desenho impresso.
A passagem da gravura à escultura passa a ser um divisor de águas e André tece novas temáticas para o trabalho. Nas suas palavras, “é a ‘língua’ que emite a palavra primeira, é ela que escava seus sentidos, e ainda, é a língua que, ao modular o ar com seus movimentos, esculpe pensamentos”. André brinca com uma certa “irrazão”, conceito de Ponty, situando uma verdade para sua criação, ou seja, ao acercar-se do fenômeno interrogado, encontra evidências próprias, “distancia-se da razão e puxa fios da não-coincidência sem procurar sínteses apaziguantes”.
Em “O Rumor da Língua”, exposição que inaugura na Casagaleria, a partir de 25 de abril p. f . , André Bonani se apropria das matérias metal, como extensão da matriz metálica e da madeira, como veios e camadas “escritas” do tempo que passa, em sua coleta de sobras da marcenaria e fragmentos de árvores.
Os materiais, agora, conversam por meio de “línguas metálicas” que se dobram sobre si mesmas, se acomodam nos encaixes de madeira e, silenciosamente, vigiam as inscrições da história matérica.
Carmen S. G. Aranha